segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Poesia Regional

Poesia Regional

São 3 e 10. Desloco-me
à cidade. A viagem é patéticamente
longa, para uma distância
tão curta
Chego à paragem com alguns minutos
de avanço – o suor do percurso a pé
reveste-me o peito; as faces e testa
pingam. Entro na loja
chinesa e pergunto se têm água. Só
no Miniprêço! Felizmente há uma
ventoinha – deixo-me enredar na sua
ladaínha fresca, apenas por uns
instantes. O autocarro vem
vazio. Escolho um lugar onde o ar
condicionado funcione – ufa desta
tenho sorte. Trago o computador que abro e logo
começo a escrever. A estrada
não ajuda – parece que vamos
no pneumático de um martelo.

A paisagem:
do lado direito, eucaliptos
do esquerdo, mimosas, por vezes
pinheiros infestados com a
moléstia e esquecidos; um ou outro
carvalho ou sobreiro
crepitam à espera da chama
prometida. A coisa
prolonga-se, depois casinhas e ruas estreitas
repetem-se curva atrás de curva
numa monótona sucessão
em timbres familiares. Por fim
os rios devolvem-nos à cidade e então
são as rotundas, as casas e os prédios - a roerem-se de inveja - e os jacarandás sem flor
e os plátanos e uma linha de comboio
a submergir-se em ervas
daninhas; o estádio, as tascas, as vivendas -
onde viviam pessoas e agora
negócios prosperam ou vêm
a falir – os palácios, as escolas
e, de repente, imersa em pleno
centro e numa nostalgia de requinte
urbano, uma estação abandonada espera
com ar de adolescente introvertido
e alguma rebeldia, não se sabe bem
o quê. O parque, contempla o
rio, que aqui, abre todo o seu coração
e se mostra belo e compassivo.

Exactamente às 4 e 38
chegamos
ao destino.

© 2016, José Coelho


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