sexta-feira, 28 de abril de 2017

Valerians Do Not Migrate

Valerians Do not Migrate
Valerians, by the late-afternoon, shake
The breeze descends from the mountain
looking for its heat. Children
by the roadside, on a mattress, jump
and their voices confuse themselves
In the unrest of trees
the suggestion of an existence is born
without order -
one that cares and regulates -
of a forgotten transit system
where sulfuric nausea
governs

At the water's edge a Swiss watch
Keeps track of time
On a garden's bench
Important things are said:
take good care of the kids and of you
do not lose hope
those days will come back
be strong and fight while
the sun - or the moon - shine
The soul, it purges itself
with each step in the direction
- possible, unique -
whereas fast and short is the moment
in which the eyes unravel
the dilemma – then we must keep it in mind
memorize it, give it bed and den -
soon the thirst drenches tongues ​​and tights
dirty fingers from blood and despair

[They taper and make beliefs passable!]

The priceless will to be raises dust
from the earth. The valerians, indifferent, breathe
get stiffen and prepare to sleep
Children no longer jump, their pubescent stares fix
on the horizon, an immaterial
future, maybe just a vision
of a fine recent past.

© 2017, José Coelho


Os Nardos Não Migram

*Os Nardos Não Migram*

Os nardos ao final da tarde agitam-se
A brisa desce da montanha
à procura do seu calor. Crianças
à beira da estrada num colchão, saltam
e as suas vozes confundem-se
No desassossego das árvores
nasce a sugestão de uma existência
sem ordem -
que cuide e regule -
de um sistema de trânsito esquecido
onde rege a náusea
do enxofre

À beira da água um relógio suiço
mantém o controlo do tempo
Num banco de jardim
dizem-se coisas importantes:
cuida bem dos miudos e de ti
não percas a esperânça
esses dias hão de voltar
sê forte e pugna enquanto
o sol – ou a lua - brilhar
A alma, sim purga-se
a cada passo dado na direcção
- única, possível -
onde rápido e curto é o momento
em que os olhos desvendam
o dilema – há que tê-lo em atenção
memorizá-lo, dar-lhe cama e guarida -
logo a sede ensopa as línguas e aperta os dedos
sujos de sangue e desespero

[Eles afunilam e mediocrizam as crenças!]

A inestimável vontade de ser levanta a poeira
da terra. Os nardos, indiferentes, respiram
enrijecem-se e preparam-se para dormir
As crianças já não saltam, os seus olhares púberes
fixam no horizonte, um futuro
imaterial, apenas talvez uma visão
de um belo passado recente.

© 2017, José Coelho

domingo, 23 de abril de 2017

A Propósito de Liberdade

A Propósito de Liberdade

Ávidos somos e os bichos?
numa labuta de hábitos e prazeres
singelos dias-
boomerang
de sol vem em sol vai
a cada vez, é uma pena
a menos e é desconcertante ficar
sem asas e seguir
pensando que se pode
voar, apesar de que 
até o tempo resolve
esse vulgar
conflito

À Ana, meteram-na num envelope
amarelo – desde pequenina – para evitar
desilusões e histórias endócrinas, dessas capazes
de tudo. Enfim, nasceu com os botõezinhos
todos no sítio – dir-se-ia perfeita – mas logo
lhe viram males onde, por defeito, só
existiam bens e então vá de
admoestar a sua natureza bravia
povoando-a de cores
suaves e dóceis. Apesar da incisiva
insistência, e das lavagens em massa
tipo brioche, a sua ingénita crista
teimava em crescer, numa de incitação
aos céus – diziam. Daí que
não restaram outras saídas:
começaram por cortar-lhe as zonas mais
salientes – dos seios, os mamilos e das nádegas
apenas umas dobras – poupando-lhe
os membros na condição de aceitar 
usar roupa e calçado anti-crescimento. Assim
depois desta fase preparatória, ela
sem resistência, entrou, de livre e expontânea
vontade
para o referido envelope –
que era amarelo.

© 2017, José Coelho



quarta-feira, 19 de abril de 2017

Pequenos Desejos

Pequenos Desejos

Quando a dor ganhou nela
resolvi que o melhor seria imaginá-la, em mim
Assim poderia controlar o fluxo
de sangue, gota a gota, dirigindo-se
dos ápices ao centro da sua terra-
lua e talvez ser, aí
calmamente
toda a poesia em si
estratificada. Nessa loucura
iniciei uma cura de bebida e leitura -
eu lia-te e bebia-te sem saber
se era em ti ou em mim
que a dor, apaziguava – e tal como
aprisionado, marcava traços numa pele -
minha ou dela - na esperança
de um dia podermos sair
de lá os dois, rumo à
liberdade.

© 2017, José Coelho


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Small Desires

When the pain won in her
I decided that the best would be to imagine her in me
Hence, I could control the flow
of blood, drop by drop, heading itself
from the apexes to the center of its earth-
moon and maybe be, there
calmly
all the poetry in herself
stratified. In this madness
I started a healing of drinking and reading -
I read you and drank you without knowing
if it was in you or in me
that the pain, appeased - and just as
imprisoned, I marked traces on a skin -
mine or hers - in hope
one day we could leave
from there, the two, towards
freedom.

© 2017, José Coelho


quarta-feira, 12 de abril de 2017

Vidas

*Vidas*

Ele disse:

Dediquei-me a estudar
os silêncios li-os, pensei-os
exercitando-os em formas livres
como nuvens, serenas como pele
Porém, apenas ontem
quando sonhando o orvalho
nos uniu, compreendi a sua natureza
e mistério.

Eu escutei

© 2017, José Coelho


Imagem: José Coelho
Fotografia de quadro de Lucio Fontana

sábado, 1 de abril de 2017

Aprendizagem da Ironia

Aprendizagem da Ironia

O que é uma motoserra
para aplacar árvores, é uma máquina
    porque se cortam
    as florestas, por que se cor tam pa
    r'evitar que ardam
    e os rios, esses
    são lágrimas em esses pela natureza
    que ela rejeita pelo absurdo
    das intenções
mastigadas, engolidas, defecadas até ao verão
havemos de matar os ventos onde
insectos se esfumam em pólen
    ventos desatentos fumigando memórias
    em forma de medo
    e das pedras aquietadas surge
    uma vontade de rolar e ser
    leito e embuste
    ao caústico dente de aço

[no abate
denoto uma alegria e uma vontade de partilha]

O que é um coração, além
do lugar onde se fecham todos os segredos
dos céus e da terra, dele derivam
os limite da nossa aprendizagem
modesta e recôndita -
a supra-suma sabedoria
- disse ela, tentando convencer-me
a negrito, da necessidade de ser mais
sincero, genuíno, fluido – e eu
sem mais delongas
calei-me.

© 2017, José Coelho