segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Contrições

Pesos oscilantes, como memórias construindo a noção de tempo vago inseguro, talvez apenas o resíduo de certas imagens, escorregando, distorcidas, temporariamente, sempre temporariamente, enclausuradas numa cápsula de vidro, velho

Rodamo-la na esperança de ver, com paciência, o interior, como nas imagens do livro, que não estão lá, escondem-se, e depois de esquecidas, aparecem, vivas num admirável leque de contornos

Mas a luz é soberba e cega. o sangue flui devagar, a medo, e a ânsia, essa, galga o horizonte contrito das vidas que temporariamente esquecem, deitadas sob areia deste sol, redondo.

Mesmo que só (havia, porém,) um desenhar de ósculos a lamber a terra no vai-vem das ondas, uma floração contínua no limiar das nuvens, uma anunciação precoce na transparência das vestes, finas e reticulares mãos palpando a textura da fronteira entre o ser sujeito e o ser objecto

Pergunto-me se haveria um plano, esquecido numa qualquer gaveta sem mapeamento, a qual terei, porventura, negligenciado - morro por abrir e revê-la como quando caminho por uma rua da minha infância, lentamente, adocicando cada porta, cada janela, cada tijolo à mostra, respirando um elemento que apenas posso classificar de, mágico, pois é esse que me aproxima, de mim, dos outros e nos injecta luz

Quantas terão sido as  vezes que abusei do amor dos outros?

© José Coelho, 2018



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