as
ruas mudaram de forma e função,
as
árvores estão lá, no mesmo sítio
sombreando
as mesmas janelas
através
das quais eu costumava deslumbrar-me.
A
cidade expandiu-se, alucinantemente
[...isto
não é uma mão cheia de vidro, nas mãos de um artesão, numa
fábrica em Murano!]
mas..
tive de aceitar as mudanças
forjando
a minha percepção interior, adaptando-a a ela.
Ao
entrar na Av 25 de Abril
há
que pôr os óculos de sol mais fortes
apertar
o colete ao máximo
esperando
a qualquer momento
que
elas rebentem de dentro do teu peito
inflando
torax e coração
tal
e qual o artesão dando vida (em tempo nenhum)
frágil,
esplêndida
ao
seu cavalo,
Ouve,
eu já chorei uma dúzia de vezes
e
voltarei a repetí-las se tiver de (ser),
despertar
uma realidade há muito tempo ida
não
é uma hóstia derretendo
como
se a tivesses deixado pousar dentro da tua boca,
colada
à tua língua, embalada em aleluias virgens
numa
tarde manhã de domingo
Custa
mais do que isso!
Uma
sensibilidade aguda não permanece indiferente perante
a
decadência dos edifícios, então novos,
os
maravilhosamente genuínos padrões,
desenhados
na pedra da calçada portuguesa,
levando
a imaginação ao rubro de inúmeros passeios citadinos,
o
frenesim de rapazes e raparigas entre dois toques de campainha,
a
entrar e sair da escola,
as
duas livrarias na zona norte da avenida
uma
do lado esquerdo, a outra do direito
estilo
enciclopédico, prenhes de bafiento conhecimento,
será
ainda o mesmo dono?
Não
tenho coragem de verificar!
Mas
o pior, senão mesmo o melhor, é
quando
se chega ao estomago,
situado
na secção média algures entre norte e sul
mesmo
pegado ao liceu onde eu fiz o secundário e
precisamente
em frente à garagem, já desaparecida,
para
a qual o meu pai olhava, enquanto fumava os seus cigarros SG filtro
debaixo
do alpendre.
Precisamente
aí, intocável
encontra-se
um prédio, em tudo similar ao nosso de 2ois andares
mesmas
portas e portão de ferro, mesmos jardins, mesmas cores
e
até incompreensivelmente algumas das mesmas pessoas!
Não
houve tijolo que não tivesse envelhecido,
as
cores desmaiaram,
tinta
caíu,
rachas
na parede intensificaram-se
talvez
haja agora mais ratazanas
plantas
descomunais surgiram
o
que eu pensei serem arbustos,
são
agora árvores e
a
dona Maria dos Gatos encolheu e enrugou um bocadito
A
minha familia não está lá.
Habitávamos
o R/c dto, o melhor!
Janelas
para o sul e o oeste – muito importante!
As
vistas eram sempre um desafio de
variações
de luz ajustadas pela altura dos estores
subidos
a meio, completamente ou descidos
permitindo
fazer um retrato detalhado do painel de azulejos
na
fachada da casa em frente, do outro lado da rua,
um
por de sol inflamado, com uma gaivota voando por cima da cidade,
bem
como acompanhar o ondulante devaneio feminino
de
e para a escola.
Aos
fins de semana
a
paz, qual maré alta, invadia o bairro
segura
e firmemente
apenas
permitindo alguns recuos em ocasiões especiais
como
a senhora do bolo doce
a
carrinha dos gelados
ou
o altifalante do circo
Mas
isso era tudo.
Eu
não quero lembrar-me,
mas
é impossível evitá-lo porque
a
necessidade conduz-me ao local
de
vez em quando.
É
como respirar noutra dimensão!
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