sábado, 7 de dezembro de 2013

B.A.D. Portuguese version

De regresso à minha cidade-natal

as ruas mudaram de forma e função,
as árvores estão lá, no mesmo sítio
sombreando as mesmas janelas
através das quais eu costumava deslumbrar-me.
A cidade expandiu-se, alucinantemente
[...isto não é uma mão cheia de vidro, nas mãos de um artesão, numa fábrica em Murano!]
mas.. tive de aceitar as mudanças
forjando a minha percepção interior, adaptando-a a ela.

Ao entrar na Av 25 de Abril
há que pôr os óculos de sol mais fortes
apertar o colete ao máximo
esperando a qualquer momento
que elas rebentem de dentro do teu peito
inflando torax e coração
tal e qual o artesão dando vida (em tempo nenhum)
frágil, esplêndida
ao seu cavalo,

Ouve, eu já chorei uma dúzia de vezes
e voltarei a repetí-las se tiver de (ser),
despertar uma realidade há muito tempo ida
não é uma hóstia derretendo
como se a tivesses deixado pousar dentro da tua boca,
colada à tua língua, embalada em aleluias virgens
numa tarde manhã de domingo

Custa mais do que isso!
Uma sensibilidade aguda não permanece indiferente perante
a decadência dos edifícios, então novos,
os maravilhosamente genuínos padrões,
desenhados na pedra da calçada portuguesa,
levando a imaginação ao rubro de inúmeros passeios citadinos,
o frenesim de rapazes e raparigas entre dois toques de campainha,
a entrar e sair da escola,
as duas livrarias na zona norte da avenida
uma do lado esquerdo, a outra do direito
estilo enciclopédico, prenhes de bafiento conhecimento,
será ainda o mesmo dono?
Não tenho coragem de verificar!

Mas o pior, senão mesmo o melhor, é
quando se chega ao estomago,
situado na secção média algures entre norte e sul
mesmo pegado ao liceu onde eu fiz o secundário e
precisamente em frente à garagem, já desaparecida,
para a qual o meu pai olhava, enquanto fumava os seus cigarros SG filtro
debaixo do alpendre.

Precisamente aí, intocável
encontra-se um prédio, em tudo similar ao nosso de 2ois andares
mesmas portas e portão de ferro, mesmos jardins, mesmas cores
e até incompreensivelmente algumas das mesmas pessoas!
Não houve tijolo que não tivesse envelhecido,
as cores desmaiaram,
tinta caíu,
rachas na parede intensificaram-se
talvez haja agora mais ratazanas
plantas descomunais surgiram
o que eu pensei serem arbustos,
são agora árvores e
a dona Maria dos Gatos encolheu e enrugou um bocadito

A minha familia não está lá.

Habitávamos o R/c dto, o melhor!
Janelas para o sul e o oeste – muito importante!
As vistas eram sempre um desafio de
variações de luz ajustadas pela altura dos estores
subidos a meio, completamente ou descidos
permitindo fazer um retrato detalhado do painel de azulejos
na fachada da casa em frente, do outro lado da rua,
um por de sol inflamado, com uma gaivota voando por cima da cidade,
bem como acompanhar o ondulante devaneio feminino
de e para a escola.

Aos fins de semana
a paz, qual maré alta, invadia o bairro
segura e firmemente
apenas permitindo alguns recuos em ocasiões especiais
como a senhora do bolo doce
a carrinha dos gelados
ou o altifalante do circo
Mas isso era tudo.

Eu não quero lembrar-me,
mas é impossível evitá-lo porque
a necessidade conduz-me ao local
de vez em quando.
É como respirar noutra dimensão!

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